25 de mar. de 2012

Só mais uma estatística


Mamãe,
mal consigo lembrar a última vez que te escrevi uma carta. Queria que a oportunidade fosse melhor do que esta.
Eu errei tanto, mãe. Tanto que não consigo mais conviver com os meus erros.
Você sabe que, desde menino, meu ídolo sempre foi o Super-Homem. Sabe que eu sempre quis ser como ele. Fazer isso defendendo a minha pátria não parecia ruim. Mas a parte ruim chegou.
Não eram só medalhas, honras e méritos. Havia sangue, muito sangue. Agora ele escorre pelas minhas mãos.
Eu fui disposto a caçar e exterminar monstros terroristas cuja alma já estava condenada. Eu procurei por eles, mãe! Acredite, eu procurei! Ansiei por encontrá-los nos olhos da primeira criança que eu matei. Mas veja que lástima, eles não estavam lá. Eram só mulheres, crianças e velhos.
Eu fui para me tornar um herói. Volto me sentindo o pior dos vilões.
Uma marionete usada por aqueles que começaram isso tudo. Uma vida por um poço de petróleo e áreas de influência.
Eu me lembro daquela mulher em Bagdá, ela andava com um objeto agarrado ao corpo por baixo de sua burca.  Algo que ela guardava como a própria vida. Só podia ser uma bomba. Atirei antes que ela explodisse. Quando fomos verificar o corpo, o choro do bebê no braço de sua mãe morta nos pegou de surpresa.
O choro daquele iraquiano órfão me perturba enquanto escrevo.
Acredita que ele virou apenas mais uma estatística?
As vozes falam alto demais.
Elas gritam em meu ouvido.
Preciso calá-las!
Já matei gente demais.
Chegou a hora de me matar.  

Um comentário:

Aymée Fávaro. disse...

Ler esse texto foi como levar um tapa na cara, sério.
Gostei demais, Ana... Se for de sua vontade, continue fazendo textos tipo esse.

<3