Se eu pudesse escolher eu escolheria te trancar num
quarto escuro. No meu quarto escuro.
Eu escolheria sair desse mundo, nem que fosse por pouco
tempo. Sair desse mundo em que não podemos nem existir. Esse mundo que nos
sujeita a um canto úmido e mal iluminado, que nos larga por lá com uma mensagem
de “se virem como podem” na testa.
Se eu tivesse o poder eu mudaria tudo. Sim, eu admito,
mudaria tudo. Talvez se eu não fosse eu e você não fosse você, mas
continuássemos sendo nós mesmos, nós seriamos permitidos.
E não me peça calma. Não me peça pra não ter pressa. Eu
preciso sempre correr, só pra ter a chance de sentir de novo aquele choque. Aquele choque. O que eu te falei. Sobre o qual
você me falou. Aquela corrente de energia ou tesão, ainda não sei ao certo, que
passamos um ao outro ainda que por fibra óptica.
Se for pra pedir deixa que eu peço. Eu peço pouco, juro.
Você nunca pede nada. Eu me sinto até culpada de vez em quando. Mas a culpa
passa quando eu lembro que você pede em silêncio. Tudo em você é silencioso, e
eu entendo perfeitamente o que você grita no silêncio. Ainda que eu finja que
não, acredite eu entendo. Sempre desacreditaram de mim quando eu comentava o
meu talento de ler entrelinhas. Tanto que eu quase deixei de lado. Mas com você
ele foi exercitado ao level máximo. Eu achei, eu li, eu captei. Mas eu gosto de
te ouvir dizer em voz alta.
E agora podemos parar com as brincadeiras? Eu não quero
brincar disso. Você tem razão, eu sou o lado mais fraco. Eu vou sempre perder e
sou uma má perdedora. Não quero mais brincar. Não quero quedas de braço com
você. Quero os seus braços em volta do meu corpo. E só. Não quero trazer
pessoas pro nosso mundo. Esse mundo que a gente inventou só tem espaço pra nós
dois. Não cabe mais ninguém. Vamos expulsá-los daqui. Da mesma forma que eles nos
expulsaram do mundo deles. Da mesma forma que não podemos ser lá, eles não
podem ser aqui.
Continue soprando aquele sopro que só você tem. Eu
continuo me movendo de acordo com o seu vento. Eu quero ser a parte mais
gostosa do seu prato, aquela que você deixa pro final. Se eu começar a me
misturar à parte comum perde a graça. Não me mande pra lá, ok? Eu prometo que
faço o mesmo com você. Prometo que guardo um lugar especial e diferenciado. Mas
tem que ser no nosso mundo. Aquele em que só cabemos nós dois. Aquele que é o
oposto desse aqui. Mas (por favor, diga se você discorda) acabou ficando mais
gostoso.